Confusão, Morte e Robôs

Diogo Stone
6 min readFeb 25, 2021

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Um raio rasgou os céus seguido por uma torrente de chamas. O golem de longos cabelos dourados absorveu o relâmpago com sua katana verde e brilhante, saltou rodopiando no ar e dividiu as labaredas. Continuou seu giro, caiu sobre o mecanoide enorme e atravessou o corpanzil da criatura metálica; surgindo por trás dela bem a tempo de evitar as explosões que se seguiram. Uma nuvem de fumaça escura espiralou ao seu lado e a imagem tremeluzente do homem de pele escura surgiu ao seu lado. Ele empunhava uma lâmina feita de gelo eterno na mão esquerda.

— Caramba Orez, cê tá bem?! — perguntou enquanto lançava uma magia com a mão direita. Seu braço era feito de rocha escura e fios incandescentes. Uma esfera brilhante pulsava em seu interior.

— Tudo certo, Mu. Onde está a Lila?

Uma explosão chamou a atenção da dupla. O arcanista agarrou o golem pelo braço e os dois desapareceram no ar, ressurgindo no topo de um prédio. Dali tinham uma bela visão da capital de Terápolis. As construções de pedra branca, os postes de iluminação, os veículos automatizados — todos em meio a fumaça que se erguia de boa parte da cidade. As máquinas haviam enlouquecido. Os auto falantes da cidade começaram a bradar sobre uma revolução e que os humanoides seriam encarcerados e serviriam de fonte de energia.

Isso e um monte de outras balelas que Mu escolheu ignorar.

— Lila! Cê quase matou a gente do coração mulher!

A hynne nem prestou atenção nos dois que se aproximavam. Ela colocava uma nova ogiva em uma espécie de cano de metal apontado para os céus. Ela mexeu em uma espécie de quadro que brilhava em verde e, a cada segundo, alguns pontos vermelhos piscavam. Alterando rapidamente algumas alavancas, a máquina disparou aquela carga para os céus, acertando em cheio uma espécie de ave metálica. A explosão arrancou uma asa da criatura que, conforme caía, era dilacerada por outros aventureiros e inventores que protegiam a cidade.

— Desculpem, o antiaéreo aqui faz muito barulho, mas funciona muito bem — riu de maneira maníaca. Mu ainda achava uma pouco esquisito os trejeitos dos inventores daquele plano.

Um trog passou correndo por eles e saltou na direção de uma centopeia metálica gigantesca que flutuava na direção deles. Puderam ouvir ao longe a voz do troglodita gritando “Kluh esmaga!” antes de atingir a criatura que grunhiu e mudou de direção.

Um apito vindo do painel da pequenina chamou a atenção deles. Ela comemorou e passou as mãos em seus cabelos lilases, sujando-os de graxa.

— Meus autômatos encontraram a fonte de controle deles. Parece uma espécie de controle mental que afeta apenas construtos — olhou preocupada para Orez.

— Deixa com a gente enquanto você fica fazendo… as coisas que você fica fazendo — Mu gesticulava mostrando as explosões e destruição ao redor.

Lila sorriu e concordou e, com uma nuvem de fumaça, a dupla homem e máquina surgiram no subsolo da grande biblioteca. Qualquer um se perderia ali, ou seria impedido de entrar por magia. Mas ser um deus tem lá suas vantagens, e Mu adorava tê-las.

Os dois correram por algum tempo, o local estava silencioso demais. O que era comum para uma biblioteca, mas estranho para uma revolução fortemente armada de seres mecanizados. Não demorou muito até que chegassem a uma sala ampla onde uma espécie de bola de cristal estava conectada a vários cabos metálicos que se perdiam de vista. Um golem estava de pé ao seu lado e brandia uma katana de energia idêntica à de Orez.

— É uma pena que eu terei que pôr um fim em vocês. Eu gostava de você, Mu.

— Eita rapaz, Amgis? Que cê tá fazendo rapaz? Tá doido é?

Orez se pôs entre o arcanista e o outro golem. Sua armadura vermelha reluziu enquanto ativava seu modo de combate. Amgis sorriu e as listras roxas que cruzavam sua cabeça também brilharam.

— Ele parece que foi corrompido também, deixe-o comigo.

— Porcaria nenhuma.

Antes que Orez pudesse protestar, Mu já havia desaparecido e ressurgido em pleno ar; enterrando sua arma no chão. O relâmpago explosivo que se seguiu arremessou Amgis para trás e trincou a esfera. O golem atingiu uma parede de costas e usou-a para tomar impulso e atacar, atingindo o arcanista em cheio. Por sorte, o braço metálico impediu que fosse dividido ao meio. A onda de choque fez mais um trincado surgir na esfera.

— Vocês não compreendem! A humanidade é terrível e trará o fim de toda a civilização! A única maneira de impedirmos isso, é isolando-os. Vocês — diz apontando a espada para Mu — viveriam num mundo virtual, mas exatamente como esse. A diferença é que quando vocês destruírem ele, nós apenas o iniciaríamos novamente.

— Que coisa mais idiota — era Mu.

— Idiota ou não, chega dessa palhaçada — Orez saltou com tanta velocidade que parecia um dos teleportes do arcanista.

O choque das espadas enérgicas fazia um som esquisito e lançava faíscas arcanas para todos os lados. Os golpes seriam impossíveis de acompanhar se Mu não tivesse sentidos sobrenaturais. Correu para acompanhar a luta desenfreada e logo estava trocando golpes de espada também, revezando seus ataques com o de Orez.

Amgis permanecia na defensiva. Era preciso e elegante, mas algo era incomum. Ele não parecia estar tentando golpeá-los, queria apenas ganhar tempo. O golem vermelho não percebeu, mas a mente perspicaz de Mu, sim. Sondou os arredores e viu que a esfera trincada mudava de cor conforme lutavam. Estalou os dedos e apareceu sobre ela. Pousou o braço metálico sobre a espada e assoviou alto. Os golens saltaram para trás e o encararam.

— O que acontece se eu destruir essa porcaria?

— Você mataria a todos nesta cidade. O vírus que criei se origina daqui e a energia para mantê-lo é retirada de todos os cantos de Terápolis. É impossível de desligá-lo sem que se torne instável e exploda.

Mu praguejou e lançou um olhar para Orez. O golem parecia determinado e, como um raio, correu até onde o arcanista estava. Entregou sua arma par o homem e sorriu triste. Antes que pudesse perguntar qualquer coisa, Amgis surgiu ao lado deles. O construto se movia tão rápido que parecia piscar entre o tempo e espaço. O homem foi arremessado para trás com uma ombrada poderosa e a lâmina brilhante do recém-chegado perfurou o peito de Orez.

— Seu traidor, era para nós governarmos este novo mundo juntos! — Amgis cuspiu com desprezo.

— O novo mundo nasce hoje — disse agarrando-o com um braço enquanto o outro tornava-se uma espécie de canhão — , mas nele, eu e você não existimos.

Com um disparo na esfera e um barulho ensurdecedor, uma bolha de luz azul se formou ao redor dos golens. A explosão que rugiu criou um brilho tão intenso que Mu foi obrigado a desviar o olhar. Ela durou alguns segundos e o barulho pode ser ouvido em Arton, por sorte o arcanista estava sob efeito de magias que protegiam seus ouvidos.

Quando a bolha se dissipou, não restava nada naquele ponto. Como se o próprio vazio tivesse dragado os construtos e aquele artefato esquisito para o nada.

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Andando em meio aos destroços de construtos, Lila procurava por Mu. A destruição do artefato havia desligado todas as máquinas sem inteligência e devolvido a sanidade às que tinham sido corrompidas. Os outros inventores dariam conta de verificar se estavam bem, mas ela precisava ver seu amigo. Acabou encontrando-o sentado em alguns destroços.

— Mu? Você tá chorando?

— Hã? Não, que isso — mentiu esfregando o rosto ao encarar a amiga.

— Cadê o Orez?

O homem respirou fundo.

— Ele se foi. O Amgis estava por trás desse tal vírus, falando de uns lances aí sobre algo virtual e não sei o que. Não entendi metade do que ele disse. Essa espada foi tudo que restou do Orez — completou exibindo a espada que, agora, desligada, era apenas um cabo sem lâmina.

— Interessante. Dizem que a katana é a alma do Samurai, ele deveria gostar muito de você pra lhe dar um presente desses e… o que são esses números no cabo?

Os dois analisaram aquela informação por um tempo sentados em meio aos escombros. O único som além das vozes deles era o crepitar de um ou outro incêndio e do mastigar de um grupo de aventureiros que comia shawarma em um restaurante que havia sobrevivido a batalha.

— Só pode ser isso — era Lila.

— Tem certeza? Coordenadas tão longe assim? No meio do nada lá nos confins do espaço?

— É o que tudo indica.

Mu assentiu, agradeceu a Lila e partiu. Iria investigar o que tinha naquele lugar, nem que precisasse reunir um time interplanar de heróis para chegar lá.

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Written by Diogo Stone

Diogo é programadore, escritore, game designer e hater de impressoras. Uma pessoa entusiasmada que escreve contos de fantasia aqui e regras de RPG na Naiá Jogos

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