Morrer foi um alívio

Diogo Stone
2 min readNov 26, 2020

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Acordei repentinamente. Haviam mortos espalhados ao meu redor, eu podia ver um colosso purista destruído ao longe e, ainda mais longe, podia ver Bielefeld. Perdemos? Pensei.

Me pus de pé e meus músculos não doeram. Estranhei. Levei minhas mãos ao rosto, mas as encarei horrorizado. Elas eram puro osso e eu teria gemido de dor, mas não estavam doendo. Atirei-me por cima do corpo de um dos meus antigos companheiros das fileiras do exército procurando por um escudo. Acabei me debruçando sobre velho Johan, pelo menos eu acho que era ele. Estava com a cabeça esmagada e o cérebro esparramado ao seu lado, então não tive certeza. Apanhei um broquel e o esfreguei o melhor que pude com minhas roupas sujas, queria apenas para ver meu reflexo. Eu estava ali, sem cabelos, sem olhos, sem rosto. Como eu enxergo? Pensei.

Eu deveria estar apavorado, mas emoção nenhuma parecia correr por dentro de mim. Demorei a perceber que era o começo da manhã, pois o sol não me aquecia. Custei a perceber a fina garoa que caía, pois a chuva já não parecia fria. Não sabia a quanto tempo a batalha tinha acontecido, pois não sentia mais fome nem sede. Nossos acampamentos não estavam mais lá e não havia mais movimentação. Era apenas eu, mortos por todos os lados e a lembrança de um bárbaro gigante, brandindo um machado de pedra enorme enquanto findava minha vida. Por que não estou morto? Pensei.

Meus antigos colegas estavam caídos aos montes ao meu redor. Mortos, esfacelados e com suas roupas e corpos rasgados; sangue pra todo lado. Os equipamentos estavam destruídos, os cavalos abatidos, haviam cabeças sem corpos e soldados esmagados. Uma cena horrível. A batalha parecia não ter ocorrido a muito tempo, mas a carne podre já tinha descolado dos meus ossos que, agora, já não precisavam mais de músculos. O cheiro deveria estar insuportável, mas eu não podia senti-lo. Ainda bem. Pensei.

Eu não queria estar na guerra, mas se você é de Yuden, parece não ter escolha sobre sua vida. Eu não queria levantar uma espada, eu gostava de caligrafia e poesia; mas se você é de Yuden, você tem que ser um guerreiro. Eu nunca quis pensar em estratégias ou pertencer as fileiras de soldados, eu queria escrever músicas e estudar artes; mas se você é de Yuden, o exército é a nação. Eu nunca cultuei Valkaria ou Keen; mas se você é de Yuden até o deus que você deve seguir é decidido quando você nasce. Mas e quando você renasce? Pensei.

A guerra que tomava Arton acabara? Não sei. Todos que me conheceram em vida deviam achar que morri, mas pensando bem, eles teriam razão. De fato, eu morri, só não continuei morto. Seria meu destino cair em batalha? Também não sei. Mas agora quem ditaria meu destino não seria mais a rigidez de Yuden, ou meus pais, ou um general qualquer que eu nem conheço, mas deveria dar minha vida por ele.

Sem família, sem exército, sem nação. É bom estar vivo de verdade, mesmo que eu tenha que ter morrido pra isso. Pensei.

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Diogo Stone
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Written by Diogo Stone

Diogo é programadore, escritore, game designer e hater de impressoras. Uma pessoa entusiasmada que escreve contos de fantasia aqui e regras de RPG na Naiá Jogos

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