O sonho do açougueiro

Diogo Stone
2 min readMay 3, 2021

--

O manto de Tenebra cobria as casas em Valkaria, a escuridão e o silêncio reinavam. As ruas estavam vazias e as pessoas dormiam em paz. Entretanto, a calmaria começava a ser preenchida por um som que — ouvidos treinados — saberiam ser artificial.

“I see trees of green, red roses too

I see them bloom for me and you

And I think to myself, what a wonderful world.”

As luzes dos fundos de uma loja estavam acesas e a música vinha de lá. Olhando pela janela, era possível ver várias bancadas, ingredientes e doces. Uma confeitaria. Também podia se ver, balançando no ritmo da música enquanto preparava algo, a figura de um pequenino vestindo um avental. Ele cantarolava junto do aparato que emitia aquele som fantasma, seguindo o ritmo daquela canção.

”I see skies of blue and clouds of white

The bright blessed days, the dark sacred night

And I think to myself, what a wonderful world.”

Após a pequena pausa embalado pelo ritmo da música, o confeiteiro se debruçou sobre a mesa novamente. Levantava e descia seu cutelo com força sobre a bancada. A cada batida, todo o conteúdo sobre a mesa tremia. Em uma das pancadas, algo voara para longe. O pequenino resmungou e andou na direção daquele pedaço que caíra repentinamente. A música seguia.

“The colors of the rainbow, so pretty in the sky

Are also on the faces of people going by

I see friends shaking hands, saying: How do you do?”

Ele apanhou o conteúdo e voltou para a bancada. Quando se virou para a janela, foi possível ver que ele carregava uma mão decepada. Seu avental estava coberto de sangue e, sobre a mesa, haviam os restos do que um dia fora uma pessoa. Ele atirou a mão em uma panela e voltou a bater o cutelo nos restos mortais daquele pobre coitado que cruzou seu caminho naquela noite.

A figura parou repentinamente, com ouvidos atentos. Ele se virou para trás, para a janela de onde era observado. O sorriso torto do hynne era agradável, mas os olhos eram apenas um brilho vermelho. Em sua mente, quem observava ouvia uma risada se arrastando.

“He… He he… He he heeeee… He.”

Sem olhar para o que um dia foi um cidadão valkariano sobre a bancada, ele desferiu outro golpe. A pancada fez Fingo acordar de supetão, chutando a cadeira a sua frente. Havia pego no sono mais uma vez na confeitaria. Estava trabalhando demais. Esfregou os olhos e foi buscar um café, lembrando do pesadelo que acabara de ter. Era um pesadelo, certo? Levou a mão ao peito e limpou algo gosmento e avermelhado no avental. Geleia. Havia esmagado alguns muffins sobre a bancada. Suspirou de novo e logo percebeu que uma música terminava no seu pequeno dispositivo emissor de ondas sonoras. Praguejou em silêncio. Precisava de um nome para ele, aquele era muito técnico. Contudo, a música terminava com:

”Yes, I think to myself, what a wonderful world.

--

--

Diogo Stone
Diogo Stone

Written by Diogo Stone

Diogo é programadore, escritore, game designer e hater de impressoras. Uma pessoa entusiasmada que escreve contos de fantasia aqui e regras de RPG na Naiá Jogos

No responses yet