Temporal

Diogo Stone
9 min readNov 12, 2020

--

ARTON #214978

A dahlan arfava e milhares de alternativas passavam pela sua cabeça. Tinha que pensar rápido, falar com ainda mais velocidade e retornar para seus amigos que lutavam por suas vidas. Olhou o dragão-rei em seus olhos verdes, respirou fundo e começou:

— Hydora, eu preciso que você fique aqui.

— Mas eu vou perder toda a diversão? — a voz um tanto aguda trazia perplexidade.

— Não é brincadeira, e não somos babás. Aquele maníaco de fogo, Uriel, conhece a magia Morte Estelar. Nem você pode escapar daquilo.

O dragão fez uma cara de espanto.

— Você quer me dar ordens?! Morte Estelar é só um raiozinho e eu posso desviar!

— Não. Não pode e eu não tenho tempo para discutir, só fique aqui, por favor. Faço isso em consideração a Benthos.

Hydora deu de ombros e olhou para uma criatura que começava a surgir ao seu lado no labirinto. Estalou a língua e um relâmpago irrompeu de sua boca, pulverizando o monstro e fazendo seu cabelo azul celeste erguer-se com a estática. Voltou-se sério para Prunna e respondeu com uma voz gutural.

— Então vá garota.

Num piscar de olhos, ela estava de volta ao campo de magibol. Havia cinco Mikazukis proferindo cânticos enquanto Mithanar parecia confuso. Contudo, Uriel avançava sobre Sedrywen bradando.

— Eu não serei vencido novamente! Dessa vez eu sei por onde começar!

A dahlan havia desaparecido em seu labirinto interdimensional assim que os inimigos tinham colocado os pés no campo. Era a única coisa que sabia que poderia salvar Hydora da Morte Estelar. Agora, enquanto seus amigos eram atacados, pode ver melhor seus inimigos. Mithanar parecia o mesmo de antes, mas traços de corrupção aberrante se estendiam pelo seu corpo e carapaças cobriam suas mãos. Uriel era o mais bizarro. O anjo de fogo ardia com intensidade renovada, mas algo parecia fora do lugar, parecia não ser.

O corte de gigantesca espada de Uriel acertou a elfa com força. Veloz e preciso, um milagre havia impedido o golpe de matá-la. Mu disparou três Lâminas de ar na direção do anjo de fogo, todas em locais precisos, decepando sua única asa, e ambos os braços. Mas antes que os membros tocassem o chão, fibras carmesins saltaram de seu corpo, trazendo-os de volta e selando-os novamente em seus devidos lugares. Uriel riu.

— Eu pensei em um presente maravilhoso para vocês — seu sorriso se alongou mais do que seria possível para uma pessoa comum — devo deixá-los desesperados?

Zanshin levou a mão até a espada enquanto Kuraiga se fundia ao tamuraniano. Logo, sombras negras tremeluziam acima de sua cabeça e seus olhos brilhavam em vermelho. Mithanar, agora concentrado, desferiu quatro socos rápidos em Mu, derrubando-o com facilidade. O elfo avançou contra Zanshin e, antes mesmo de desembainhar sua lâmina, um chute preciso em seu rosto o levou ao chão.

Prunna viu os lábios de Mikazuki se pintarem de alegria, ele planejava algo e ela precisava agir. O homem era um arcano habilidoso e certamente teria condições de atrapalhá-la. Não poderia correr o risco de ser impedida, tinha muitas ideias, mas não tinha tempo. Tempo. Ele era a resposta.

— Por Arton, pare o tempo!

Com um estrondo que apenas a dahlan pode ouvir, a cena que presenciava desacelerou até congelar, havia vencido o tempo momentaneamente. Estava satisfeita, mas não poderia sustentar a realidade para sempre.

Um segundo tinha passado. Olhou para Mikazuki e seus clones, precisaria fazer o mesmo se quisesse ter sucesso em seu plano.

Dois segundos tinham passado. Concentrou-se e entonou uma cantiga.

Três segundos tinham passado. Enquanto cantava, seus cabelos rosas flutuavam e um poder arcano envolvia seu corpo.

Quatro segundos tinham passado. Logo, outras três Prunnas estavam ao seu redor.

Cinco segundos tinham passado. Suas duplicatas correram até seus amigos caídos.

Seis segundos tinham passado. Elas cantarolavam uma música doce e revigorante no caminho.

Sete segundos tinham passado. Então, a dahlan começou a tocar uma marcha empolgante em seu tambor.

Oito segundos tinham passado.O couro vibrava com alegria e intensidade e ela sorriu para si, daria certo.

Nove segundos tinham passado.

— E o tempo volta a correr.

A expressão de surpresa no rosto de Mikazuki fez o esforço ter valido a pena. Zanshin, com seus ferimentos recém fechados, atirou-se contra Uriel. A fusão com o demônio das sombras aconteceu de maneira instantânea enquanto sacava sua espada com fervor, impulsionado pela marcha de Prunna. Concentrou-se no poder divino em seu sangue, dando seu melhor para usar uma fração do poder infinito de seu pai.

— Kensei Tanjou Ryuu – Arashi — o golpe infalível.

Brandindo a lâmina com velocidade e precisão, o filho de Lin-wu partiu o chão a sua frente; junto com o estádio de magibol, as nuvens do céu e o corpo de Uriel. O estrondo balançou a terra e derrubou algumas pessoas que corriam em desespero. Contudo, antes das partes flamejantes do anjo de fogo atingirem o solo, a massa aberrante estendeu-se, juntou-se e remendou o corpo que agora ardia com mais furor. Antes que qualquer um pudesse reagir, cansado demais para responder ao ataque, Zanshin foi trespassado pela enorme lâmina de seu inimigo e chutado ao chão.

Sem pensar duas vezes, Mu e Sedrywen pularam na direção do amigo. Num estalar de dedos o homem tentou tirar o tamuraniano caído, mas Uriel foi mais rápido e o chutou para longe. As flechas de Sedrywen o atingiam como furacões, mas o vilão apenas sorria enquanto andava em sua direção. Prunna tentou intervir, mas Mikazuki terminou de entoar um ritual e um relâmpago vermelho rasgou os céus e a atingiu. Numa questão de segundos, uma chuva caía sobre suas cabeças. Forte e ácida. A dahlan começou a se pôr de pé, mas a água aberrante que vinha dos céus a forçava contra o chão. Olhou ao redor e o lorde havia sumido, voltou a face para cima e o horror percorreu seu corpo. Ele havia, de alguma forma, trazido a tempestade até ali. Logo, tudo seria lefeu.

A elfa desviava e saltava dos golpes de Uriel, mas a cada pingo de chuva que caía, ela ficava mais lenta. Logo, tornou-se impossível escapar das investidas. O primeiro golpe acertou seu peito, lacerando algumas costelas e a atirando ao chão. A segunda foi uma estocada covarde e certeira contra um alvo caído, perfurando seu coração. Um grito abafado pelo som do temporal veio de Mu. Estalou os dedos, mas a magia falhou, tentou de novo e sumiu numa nuvem de fumaça para reaparecer próximo a Sedrywen. Antes que pudesse reagir, Mithanar o alcançou. Com dois chutes rápidos quebrou a concentração do arcano e com um poderoso soco, atravessou seu peito. Os olhos ficaram brancos, cuspiu sangue e caiu ao lado da elfa.

— Dois já foram, faltam dois! — o elfo com a mão ensanguentada parecia se divertir.

Correu na direção de Prunna, mas em uma explosão de eletricidade e ácido, Mithanar foi arremessado para longe. Estava enfurecida.

— Não permitirei que vocês façam o que quiserem com meus amigos!

A dahlan ergueu a mão a frente, a pele queimando sob a chuva. Havia uma solução, uma extrema. Estalou os dedos e cantou:

— Sob o céu estrelado e o ar molhado, a destruição faz para mim o que for desejado! Morte Estelar!

A expressão de Uriel enrijeceu por uns instantes. Energias arcanas envolveram o braço de Prunna toscamente, espiralaram e desapareceram. A magia havia falhado. O anjo de fogo riu.

— Diga-me pelo que você mais preza. Dê-me o prazer de tirá-lo de você — o sorriso macabro lentamente voltava a pintar seus lábios flamejantes.

Ela lembrou-se de Enki, de Benthos e viu seus amigos caídos. Tudo que ela mais prezava. Notou com horror criaturas anti-naturais que começavam a brotar do chão como apêndices monstruosas do próprio solo. O anjo de fogo ergueu a mão num gesto que ela bem conhecia, suas lágrimas já se misturavam a chuva ácida que vinha dos céus aberrantes. Ele estalou os dedos, um estrondo se ouviu e o corpo da dahlan já não existia mais. Pulverizada pelo poder de uma estrela.

Uriel caminhou em meio as criaturas aberrantes e as poças ácidas até o tamuraniano caído, agarrando-o pelo colarinho e falando com malícia para um Zanshin semi-acordado.

— Imortais… o filho de Lin-Wu e a abençoada de Glórienn. Patético. Vamos ver se suas almas retornarão aos seus corpos depois que a tormenta as tomar para si — não iriam.

Com um movimento rápido, a cabeça do homem se perdeu em meio a tempestade. Contudo, Hydora reaparece quando a magia de Prunna se dissipa. Uriel o encara me silêncio enquanto o dragão-rei começa a inchar e aumentar de tamanho e, mais uma vez, com um estalar de dedos, o homem apagou uma estrela nos céus. Com uma agilidade sobrenatural, o rei dos ares esquiva saltando para o lado — mas é dizimado pela magia mesmo assim. Ninguém mais poderia parar as atrocidades do anjo de fogo, de Mikazuki ou dos próprios lefeu.

Aterrorizada, Rosetta corria. Fugia o mais rápido que conseguia. Estava quase chegando ao estádio de magibol quando tudo começou e observou horrorizada seus companheiros caírem um a um e, agora, temia pelo pior. O fim de Arton estava começando e ela precisaria fazer algo. Com a cabeça fervilhando de ideias e teorias, correu até Khubar sem olhar para trás.

ANOS MAIS TARDE.

A fada caminhava com dificuldade pela terra arrasada. Quanto mais próximos chegavam do centro daquele lugar, piores eram as ameaças. Contudo, seu único desafio era manter-se de pé em meio as várias poças de ácido e o solo rubro retorcido. A sua frente, um cavaleiro de armadura azulada, brandindo uma enorme espada, retalhava os lefeu que se aproximavam daquela dupla estranha. Amarrado em seu braço, o cavaleiro carregava um escudo pesado ostentando o emblema da deusa da ambição, símbolo dos libertadores de Valkaria.

A jovialidade já havia deixado Rosetta a muito tempo. Seus cabelos estavam uma lástima, a pele enrugada e a expressão dura. Reclamava a cada passo pelo esforço que fazia, mas precisava manter suas reservas de energia para o que estava por vir. Uma última tentativa de consertar tudo. Adentraram naquela área de tormenta na esperança de poder arrumar, se não o seu mundo, algum mundo.

Caminharam por horas até avistarem o antigo campo de magibol. Os dedos da fada formigaram de antecipação, finalmente estavam chegando. Não demoraram muito para adentrar no que, um dia, fora um gramado. Agora haviam pequenos tentáculos avermelhados que pareciam corroer o que os tocava. O cavaleiro derrubou o último lefeu, mas não guardou sua espada, não haveria tempo para sacá-la de novo para onde ia.

— Tem certeza que você vai ficar? — a voz grave ecoou através do elmo.

— É preciso — sua voz rachava ao falar — , Moira foi bem clara. Cada uma das infinitas possibilidades do tempo é como as várias gotas da chuva. Quanto mais pessoas atravessam o temporal, mais possibilidades distintas alteramos.

— E é por isso que viemos até uma área de tormenta, onde os lefeu venceram o tempo e poderemos usar isso a nosso favor. Sim, eu lembro disso tudo tia Rose. Eu só não queria lhe deixar para trás.

A fada sorriu. Ele havia se tornado um homem forte e corajoso, mas estava destinado à ruína naquela Arton. Assim como todos os outros que viviam naquele tempo e espaço. Deu um abraço no cavaleiro alto e encouraçado e se afastou, começando a entoar um mantra complicado que misturava palavras em dracônico, tamuraniano, élfico e mais uma dúzia de línguas que ele não identificava. Lembrou das histórias sobre seu finado tio Mu — ele certamente entenderia todas aquelas palavras.

Logo, um portal começou a se abrir e, através de um círculo dourado que se abria em meio a vermelhidão, viu um campo verdejante. Uma forma humanoide em chamas desceu dos céus na direção de uma elfa de cabelos pretos portando um arco. Viu uma mulher de cabelos rosas bradando algo inaudível de onde observava e o local pareceu congelar enquanto ela se dividia em várias copias e lançava uma miríade de magias. De onde olhava, o tempo era irrelevante, inexistente, constante. Ajeitou o escudo no braço e acenou para Rosetta.

Vai! — Rosetta bradava enquanto o homem saltava na direção da batalha.

ARTON #214978-Alpha

Mal Prunna havia levantado seus aliados, um portal dourado se abriu, revelando uma terra avermelhada e destruída. Um cavaleiro de armadura azul saltou pela fenda dimensional e se aproximou da dahlan antes de olhar para trás uma última vez. Todos acompanharam sua visão e viram a fada que finalizava uma espécie de ritual, exausta. Reconheceram que era Rosetta quem fazia a magia, seja de onde — ou quando — estivesse fazendo aquilo. Antes de desabar, a mulher disse:

— Agora depende de você, Enki.

Sign up to discover human stories that deepen your understanding of the world.

Free

Distraction-free reading. No ads.

Organize your knowledge with lists and highlights.

Tell your story. Find your audience.

Membership

Read member-only stories

Support writers you read most

Earn money for your writing

Listen to audio narrations

Read offline with the Medium app

--

--

Diogo Stone
Diogo Stone

Written by Diogo Stone

Diogo é programadore, escritore, game designer e hater de impressoras. Uma pessoa entusiasmada que escreve contos de fantasia aqui e regras de RPG na Naiá Jogos

No responses yet

Write a response