Vigília

Diogo Stone
24 min readOct 21, 2021

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Este conto foi escrito em conjunto com Alexis Gio ~ Myo.

O vulpino suspirou baixo sentado na relva. As pernas cruzadas e o tronco ereto, assim como suas orelhas em pé que se moviam para todas as direções, denotavam que estava atento a qualquer movimento — mas em seu rosto, o tédio estava claro. Era seu turno de vigia daquela noite. O primeiro dia de viagem foi longo, e ao que parecia ainda teria mais um; outro suspiro pôde ser ouvido.

Tédio era algo muito novo para Yoru. Quando sua mente era mais selvagem, isso não existia, pois era um milagre estar parado e, nesses casos, aproveitava o descanso. Mas ali, entre tantas — três — pessoas, sozinho e com uma mente que, agora, pensava como um humano, o sentimento de ócio o consumia. Já havia escrito em seu diário e admirado as estrelas e contado árvores e pensado em coisas e tentado lembrar do passado… Foram muitos pensamentos e passatempos na última hora.

Horas, essas, que acabou precisando gastar uma inteira para se localizar no tempo. Agora, era tão difícil saber o horário, clima e até mesmo seguir rastros; não que ainda não fosse bom naquilo, mas não parecia mais…

Instintivo.

Respirou fundo e fechou os olhos, concentrando-se somente nos barulhos da noite. Faltava pouco para amanhecer. Logo passaria o turno e poderia dormir, mas não queria e muito menos sentia sono. Sonhos humanos eram esquisitos e muito confusos. Da última vez que dormiu, acordou com dor de cabeça. Preferia fazer companhia à próxima pessoa que fosse vigiar, que, inclusive, Yoru já deveria estar indo acordar. E era Ukkor.

Abriu os olhos imediatamente quando o nome passou por sua mente. Seus pelos se arrepiaram e suas orelhas se estreitaram, piscando rapidamente enquanto tentava organizar o que sentia. Um enjoo do nada? Será que estava doente? Mas não era o momento de pensar nisso, e sim de chamá-lo.

Caminhou lentamente em direção a ele, que dormia em sua posição usual: sentado com as costas encostadas em um tronco e o corpo apoiado no escudo. Deu uma leve risada sem som ao constatar que algumas coisas não mudaram, mesmo depois de anos. Chegou perto, se abaixou e delicadamente repousou a mão sobre seu ombro, sacudindo-o de leve e chamando:

— Ukkor, ei, tá na hora do seu turno! — Disse baixo, quase sussurrando para não acordar as garotas, dando um leve empurrão em sua mão com o topo de sua cabeça, algo que antes fazia nos tempos em que eram só os dois na floresta.

Ukkor abriu os olhos de repente. Sempre teve sono leve e o toque em seu ombro foi o suficiente para arrancá-lo do mundo dos sonhos. Ou assim deveria ser — já que acordou encarando os olhos amarelos de Yoru. Aqueles olhos amarelos.

Assentiu e devolveu um sorriso sonolento para o outro que o olhava sereno. Espreguiçou-se, tentando não fazer barulho para que não acordasse Vanya ou Ivy. A sensação de acampar com o vulpino era familiar e gostosa. Mesmo em Barovia, era onde se sentia em paz.

Levantou-se e, antes de seguir até o ponto mais afastado para fazer vigília, aproximou seu rosto ao de Yoru. Falando baixo para que ele ouvisse e não atrapalhasse as pessoas dormindo.

— Pode deixar, Miku. Descanse um pouco agora.

A aproximação repentina, somente para falar baixo, fez o corpo do rapaz petrificar. Seria sempre assim agora? Perguntava-se enquanto acompanhava o maior com o olhar, logo fazendo isso com os pés também.

— Não estou com sono, acho… posso ficar um pouco contigo até eu sentir?

Manteve a voz baixa mesmo estando afastados das companheiras de viagem. O meio-orc indicou para que ficasse à vontade ao seu lado e o mais novo voltou a se sentar no local de antes. Mas agora, ao lado dele, olhando o horizonte.

— Companhia sempre é bem-vinda, os turnos de vigia são muito tediosos na maior parte do tempo.

— Tava entediante — disse simplesmente, lembrando dos momentos anteriores.

Era uma sensação familiar, como em várias outras ocasiões em que eles permaneciam acordados durante a noite, olhando o céu e tendo uma conversa desajeitada — já que Yoru não podia ativamente falar na época, acabando por quem dormisse primeiro pegando o turno seguinte.

Olharam os arredores por um tempo, em silêncio, escutando com atenção. Tudo parecia tranquilo. Ukkor, ainda sentado, arrastou-se um pouco para se aproximar do vulpino. Queria falar, mas não queria que soasse mais alto que os sons da mata.

Yoru provavelmente ouviria independentemente da distância dele naquele momento, por conta de sua audição aguçada. Porém, aquela aproximação era muito mais que bem-vinda — na verdade, ansiava por ela. Aproximou-se um pouco involuntariamente, deixando seus ombros se tocarem com leveza, sentindo um pouco mais o calor dele ao seu lado.

— Tem certeza que não precisa descansar? Você estava muito cansado ontem pela manhã. Ficou estirado na mesa enquanto eu e Vanya conversávamos sobre… — interrompeu-se. — Sobre mim. Por onde você andou?

Yoru deu um meio sorriso, relaxando mais.

— Tenho certeza. Eu estava mais cansado de correr do que com sono, exatamente. Eu na verdade não dormi naquele momento, estava ouvindo, só não vendo — Permitiu-se olhar o horizonte e apoiou as mãos em seus joelhos, às vezes passando as unhas grandes e pontudas como garras no tecido da própria calça.

Havia voltado a sua roupa habitual, contudo, não parecia. Sua camisa, que lembrava um kimono, apesar de larga, estava mais justa em seu corpo. Além disso, amarrara o tecido que antes se assemelhava a um turbante em volta da cabeça, um pouco à frente das orelhas, como um lenço. Seu rabo se movia lentamente por baixo da calça sem que percebesse, uma reação comum ao estar do lado de Ukkor. Especialmente a sós.

— Eu tava tirando os pôsteres com seu rosto. Tinha por toda cidade, não podia deixar ali. Tirei o máximo que podia, não quero que você fique em problemas depois que te meti em um, era o mínimo que podia fazer — ditou com calma, olhando agora os caminhos que seu polegar fazia pela trama do tecido enquanto Ukkor o olhava surpreso.

— Você sabe que não precisava recolher os cartazes, né? — Sabia que Yoru era leal, mas aquilo era perigoso — Vallaki é uma cidade racista, não precisam de muitos motivos para querer dar cabo de mim. Talvez não tenha notado, mas os olhares sobre mim são, no geral, carregados de gracinhas e preconceito por lá.

— Justamente por ser uma cidade racista, que não precisa de muito pra querer, de verdade, acabar com a gente. Logo, um cartaz de procurado não é o ideal, vai saber o que fariam com você, com seu desenho espalhado por lá; ou tentativa, porque tava muito feio. Não quero voltar lá, mas caso a gente precise, seria bom não ser por agora e que não estejam atrás de nós, né?

O meio-orc relaxou um pouco os ombros, achando graça do comentário sobre seu retrato falado. Mas ainda pensava no perigo que era a pequena raposa correndo pelas ruas e rasgando cartazes. Acompanhou com o olhar as mãos do mais novo acariciando o tecido. Por uma fração de segundos, pode senti-las massageando suas costas mais uma vez, como na noite anterior, quando se ajudaram no banho.

— Mas queria mesmo era te fazer companhia naquele buraco, fiquei frustrado e preocupado, precisava ocupar minha cabeça, acho — o vulpino concluiu.

Ukkor sorriu sereno, mas balançou a cabeça negando enquanto ele falava.

— Eu achei que você iria virar uma raposa na frente da taberneira — brincou. — Mas o lugar não tinha insetos e até que não era tão desconfortável. O importante é que não arranjamos problemas pras moças da taverna.

O mais novo deu de ombros à preocupação, virando o rosto pro homem ao seu lado e vendo-o balançar a cabeça negativamente. Sorriu levemente com a brincadeira.

Era engraçado como ele o conhecia sem precisar dizer muito, o que era estranho já que em teoria tinha uma forma de pensar diferente agora. Concluiu que talvez não fosse tão diferente assim.

— Eu quase fiz, quase mesmo, mas não queria nos arranjar mais problemas… se ela dizia que você ia ficar bem, dei um voto de confiança. Mas continuei preocupado, por isso achei melhor ocupar minha própria cabeça. A mente humana é muito… esquisita. Pra dizer o mínimo.

Ele não queria arranjar problemas pras taberneiras, claro, mas se precisasse, para proteger Ukkor, não hesitaria em fazer. Apesar de tudo, sua prioridade estava ali ao seu lado. Mesmo viajando com Vanya e Ivy, ainda assim, era diferente. Óbvio que hoje gostava muito mais delas, principalmente da Vistani, que conhecia há mais tempo do que a Vallakiana. Mas não era a mesma coisa.

E se Ukkor dissesse algo como “vamos embora”, não hesitaria em segui-lo, apesar de tudo. Era só quem precisava, o que viesse não importava.

Yoru tinha o semblante franzido e o olhar vago, um pouco baixo e além do amigo, perdendo-se em seus próprios pensamentos enquanto falava. Piscou algumas vezes, voltando à realidade e então fitou o maior ao seu lado, voltando sua face comum e indiferente, mas com um toque de cuidado em seus olhos. As orelhas abaixaram um pouco, ficando em noventa graus com a cabeça. Atento, mas só aquele pequeno espaço — só atento a Ukkor.

— Nossa mente é esquisita, sim. Pior do que isso é tentar entender a si mesmo. Eu, por exemplo, sei o que me deixa irritado, mas não consigo evitar. Tem coisas que continuam sendo instintivas.

O vulpino ouvia atentamente e concluía que não eram muito diferentes, com a diferença de que o raposa não ligava para os outros. Um misto de indiferença e desgosto. Importar-se significava pensar sobre, e ele preferia não fazê-lo. Os outros que se fodessem.

— Já parou pra pensar que, querendo ou não, tem a ver com se importar demais? Digo, eu senti raiva do cara que amassou minha bochecha com aquela… Bengala? Acho que era. Mas ele era tão insignificante que aquilo não importava, pra mim meu foco era te manter seguro — concluiu olhando pro céu dando uma leve clareada, se aproximando do horário do nascer do sol. — Então pra que gastar energia contra ele se ela estava focada em você?

Olhou o vulpino, franzindo o cenho. Sem entender muito bem o que ele quis dizer com aquilo.

— Eu quase quebrei a droga do cadeado e enfiei aquela bengala no… — interrompeu-se com um suspiro, Yoru riu baixo e empurrou-o com o ombro. — Obrigado por estar ali por mim, Miku.

Ajeitou-se no lugar, incomodado com o chão duro antes de continuar.

— Às vezes não é sobre se importar demais, não com todo mundo. É sobre se importar com as pessoas certas. Como Vanya com a filha, Ivy com a irmã — pensou um pouco antes de concluir — , ou eu e você um com o outro.

Um sorriso singelo apareceu nos lábios do vulpino ao ouvir sobre eles.

— Sempre aqui. Prometo não roubar sua pelúcia de novo.

A promessa de que estaria ali acalmava o meio-orc, que riu quando citou a boneca roubada. O mais novo sentia que era algo muito especial que tinham, e cada um tinha uma ligação diferente, de certa forma. “Maternal? Irmandade?… Parceria?”, ele pensava franzindo o cenho ao fim. Aquelas palavras não parecia encaixar muito bem. Óbvio que eram grandes parceiros, leais um com o outro, mas parecia errado o título.

Deixou isso pra lá por enquanto.

O mais velho virou o rosto para o vulpino, mas com os olhos ainda presos ao longe; desviando seu olhar ao mais novo apenas para falar:

— Você está bem com tudo isso?

Bem sobre o quê? Sobre a mudança de raciocínio? Sobre o dia anterior ou sobre ficar acordado? Eram dúvidas que corriam na mente de Yoru. O outro havia sido vago demais para o turbilhão da mente recém racional dele, que virou levemente a cabeça de lado, com o semblante um pouco confuso. Suas orelhas apontavam cada uma pra uma direção diferente, mostrando sua desorientação.

— Eu acredito que sim, não tô com fome, sem sono, tô inteiro e tô com você. Acho que tô bem — respondeu simples e com um levíssimo toque de ingenuidade. Efeito Ukkor, afinal.

O mais velho respirou fundo, olhando novamente para a escuridão que, aos poucos, cedia espaço à luz fraca que chegava a Barovia.

— Eu fico feliz que esteja bem — concluiu.

— E você, está bem? Como estão suas cicatrizes? — Pegou a mão mais próxima e colocou ela com palma para cima na própria coxa, passando os dedos lentamente e com cuidado, analisando o ferimento.

Ukkor achava estranho ver as caretas que o vulpino fazia. Ele claramente tentava racionalizar alguma coisa e, somente nesses momentos, suas feições costumavam mudar. Espanto, alegria, curiosidade. E todas elas traziam à tona a beleza dos traços finos do rosto do vulpino. Ele não sabia, mas aquelas caras e bocas do mais novo eram culpa sua, pois o via como um porto seguro, onde se sentia livre para fazer qualquer coisa, dizer tudo que pensava.

— Já passei por coisas piores, e você cuidou muito bem delas — disse puxando a amarra da capa, expondo o peito nu.

Indicou seu pescoço, onde mal se podia ver a marca avermelhada que havia no dia anterior, presente da berlinda a qual fora preso. Um grande sorriso se espalhou pelo rosto de Yoru, era bom saber que não haveriam marcas. Seus olhos brilhavam de felicidade enquanto fitavam o pescoço de Ukkor. Levou instintivamente a mão até a ferida que sarava, continuando o toque leve e chegando um pouco mais perto — ajoelhando-se para poder ver melhor.

— Ainda bem! Fico feliz. Não quero que essa experiência tenha lembranças físicas, só aqui! — disse levando a ponta do indicador até sua têmpora, dando um riso nasalado — Mas bom, está sarando, muito bom.

Pego um tanto de surpresa pela reação do amigo, Ukkor precisou de um ou dois segundos para respirar normalmente. O toque do mais novo sempre tinha aqueles alfinetes que pareciam prender sua pele a dele. Prendendo-os de um jeito bom.

— Acredito que tem lembranças desse dia que eu não vou esquecer — falava fitando os olhos amarelos.

De certa forma, Yoru sabia do que ele falava. Também tinha momentos daquele dia que nunca iria esquecer, com certeza; suas bochechas até coraram com isso, desviando o olhar mesmo sem saber o porquê.

Lá estava aquele calor no peito mais uma vez, uma lembrança de batimento cardíaco que já não existia mais.

O vulpino voltou a se sentar, agora com as pernas estiradas, mas fazendo-o sem querer sobre o próprio rabo, soltando um chiado de dor. Levou uma das mãos para dentro da calça, ajudando a colocar sua cauda para fora e balançando um pouco no ar, como se estivesse alongando-a. Logo, repousou-a no chão entre eles.

— Agora está melhor. É muito ruim ficar com ele preso… às vezes tenho câimbra — fez uma leve careta desgostosa, fazendo carinho nos pelos, como se os penteasse.

Ukkor sorriu triste ouvindo sobre como ele ocultava a cauda. Um lembrete doloroso de que, onde viviam, eram vistos com preconceito. Sempre. Maneou a cabeça para afastar aquele pensamento e esticou a mão à frente, em direção a cauda de Yoru. Com um olhar inquisitivo, questionou:

— Posso? — fazendo menção de acariciar a pelagem.

Yoru abriu levemente a boca em surpresa, concordando com a cabeça em silêncio. Já tinha recebido carinho em sua cauda por Ukkor antes, mas era quando estava transformado em raposa, e a muito tempo atrás. Agora, humano, e depois de tudo, parecia tão…

Íntimo.

Sentiu as maçãs do rosto esquentar novamente, mantendo o olhar nos próprios dedos passando entre os pelos, começando a ficar um pouco nervoso quando via a mão do meio-orc se aproximando, tão maior que a dele. Ukkor notou o rubor e o nervosismo e percebeu que nunca havia feito isso, não desde que descobriu que o mais novo não era só uma raposa.

— O pelo não tá dos melhores, tá todo amassado por ficar sempre na calça e além disso não tenho conseguido pentear direito e… — Yoru falava sem parar, tentando justificar qualquer possível má impressão sobre si, um pouco inseguro.

Por mais que ele arrumasse desculpas para tentar explicar a condição da pelagem, Ukkor não deu muita importância. Logo, seus dedos já percorriam caminhos entre os pelos da cauda, tomando cuidado para não puxar qualquer nó que pudesse existir ali; mas falhando em um ou outra ocasião, sempre se desculpando quando acontecia.

Assim que sentiu o toque entre seus fios, Yoru se calou, apesar da face avermelhada se manter. Acompanhava com os olhos os movimentos que o outro fazia e balançava a cabeça num silencioso “tudo bem” quando ouvia os pedidos de desculpa por puxar algum nó.

O pelo era macio e fino, apesar de estar mesmo um tanto amassado. O meio-orc desejou que pudesse se perder na sensação de leveza que aquele afago trazia. Notou a inquietação de Yoru, o rubor que persistia em sua face, apesar das palavras que se atropelavam terem cessado.

— Não diga besteiras, parece muito bem cuidado. Mas se o incomoda, eu paro, tudo bem — Ukkor dizia tirando a mão dos pelos, mesmo contra sua vontade. — Não quero você nervoso, Miku.

Logo que ele afastou a mão, pensando incomodar, Yoru começou a ficar verdadeiramente nervoso. O vulpino pensava ter se expressado mal e, agora, Ukkor achava que ele não queria aquele carinho; sendo que ele nem mesmo entendia por que estava reagindo assim.

Resolveu não falar nada. Apenas pegou a mão do mais velho, um tanto quanto hesitante, e colocou de volta em sua cauda. Suas mãos tremiam e não conseguia olhá-lo nos olhos. O rubor teimava em não deixá-lo.

— E-eu não… eu não sei porquê estou nervoso — confessou bem baixo, olhando novamente os dedos do meio-orc passando por sua pelagem, ficando um pouco mais calmo.

Ukkor sentiu a mão do vulpino tremendo, os alfinetes prendendo a pele do mais novo em sua mão calejada. Ele ainda tinha o rosto vermelho, era incapaz de encarar o meio-orc e gaguejava. O mais velho sabia qual era o misto de sensações que corriam por dentro do amigo, mas o próprio não parecia entender ainda.

Deixou a mão ser levada de volta à pelagem, continuando a acariciar com leveza, vasculhando sob os pêlos a cauda para coçá-la.

— Nervoso? — dizia com um sorriso, olhando o mais novo ainda com o rosto vermelho e o olhar baixo. — Você deve estar cansado. Encarou três megeras sozinho, trocou coisas que não entende direito, arrumou um monte de pensamentos e sentimentos novos, não conseguiu dormir com Vanya e Arabelle tagarelando e correu a noite toda juntando cartazes.

Não pode conter a excitação na voz. Estava orgulhoso de Yoru, de como ele havia crescido. Crescido. Essa era a palavra-chave. O vulpino piscou algumas vezes, confuso com seu tom mais animado. Finalmente conseguiu quebrar o rubor e olhá-lo nos olhos, tentando entender o que se passava; inclinando um pouco a cabeça para o lado, mostrando sua incerteza sobre o assunto enquanto suas orelhas permaneciam inquietas.

— …Oh! — suas orelhas ficaram de pé, mostrando sua surpresa ao constatar que realmente havia feito muita coisa.

O meio-orc interrompeu o contato com a cauda do mais novo e se ajeitou ainda sentado, esticando sua capa para o lado: um convite para o vulpino se aninhar com ele sob a capa. Como fizeram tantas outras vezes quando Yoru ainda achava que era só uma raposa.

— Acomode-se aqui e descanse um pouco.

— Bom, só fiz o que imaginei que você faria por mim… ou pra salvar quem precisa.

Comentou enquanto se ajeitava próximo a ele, sentindo o calor de sua pele aquecer sua epiderme até chegar em sua caixa torácica. Lá estava novamente a lembrança de um coração. Acabou de se aconchegar ao maior, apoiando a cabeça em seu peito, voltando a olhar o horizonte. Ukkor separou alguns segundos para respirar fundo enquanto o menor se acomodava, sentia o coração retumbar e precisou de muita força de vontade para não olhar o mais novo aninhado ao seu peito. Precisava seguir na vigília. Esperou até que estivessem confortáveis e, então, puxou a capa sobre eles; deixando-os aquecidos contra o frio baroviano.

— Por você? Faria. Por outras pessoas? Não posso garantir. Você é uma pessoa melhor do que eu. E isso é bom.

— Estamos melhorando juntos, afinal.

O mais velho, ainda sem desviar o olhar do horizonte, levou a mão que estava sob a capa até a cabeça do vulpino, acariciando a parte de trás de sua cabeça. Os cabelos recém lavados estavam macios. Yoru acabou fazendo um barulho de aceite e gosto pelo toque, fechando os olhos enquanto sentia o afago em seu cabelo e pendendo inconscientemente a cabeça em direção à mão, sorrindo levemente.

Aprendeu que gostava muito de cafunés. Ou do cafuné de Ukkor, já que o de Vanya era gostoso, mas o do meio-orc praticamente o desligava.

— Eu já estou descansando — o vulpino voltou a falar após algum tempo de silêncio aproveitando o carinho — , estar ao seu lado já me faz relaxar. E não sou eu que estou vigiando agora, afinal. E gosto de conversar contigo, me faz colocar a mente em ordem. Geralmente é só… como os humanos chamam? Ah. Caos.

— Eu também tenho dificuldade pra organizar meus pensamentos, ou prestar atenção no que deveria. O importante é você encontrar o que te move no meio desse turbilhão, e usar isso de âncora — fez uma pausa, escolhendo bem as palavras. Aparentemente, isso tinha se tornado um hábito quando falava com Yoru. — Eu demorei, mas encontrei o que me prende a realidade.

A resposta demorou para vir, pois o vulpino estava ocupado com o afago que recebia.

— E o que te prende? É óbvio que quem me prende a realidade é você, foi como eu te disse: você me mantém humano.

Sua voz era serena e mantinha os olhos fechados. Afastou a cabeça do tórax do meio-orc apenas para mexer no braço dele, aproximando as mãos dele de suas próprias orelhas vulpinas, procurando aquele carinho que havia recebido na noite anterior.

— Isso é gostoso — sussurrou fazendo seu costumeiro som de contentamento.

A declaração de Yoru atingiu Ukkor como uma pedrada. Não gostava da ideia de ser o pilar que sustentava alguém, pois tinha medo de ruir e fazer com que as pessoas que ele gostava ruíssem junto dele. Engoliu em seco. “Eu não deveria fazer isso” é tudo que corria em sua mente. Queria o vulpino bem, confortável e seguro. Mas não conseguia deixar de sentir. Não sabia como controlar algo tão primitivo quanto aquilo.

Ainda sem responder a pergunta do vulpino, acariciava as orelhas firmes com pelos curtinhos e acabou imaginando como a anatomia dele era diferente. E como queria conhecê-la melhor. “Porcaria”, pensou tentando se livrar daquele pensamento, ainda encarando a escuridão.

— Dois olhos amarelo-ocre me mantêm com os pés no chão — disse finalmente, tentando manter um tom sereno, apesar do coração ribombante.

Por um motivo que Yoru desconhecia, sentiu o coração que o meio-orc tinha vacilado uma batida, acelerado. Apesar de ter ouvido antes, no lavabo, ouvir de novo era muito gostoso. Tentava entender aquelas sensações, respirando fundo, ainda de olhos fechados. Voltou a abri-los quando sentiu um ímpeto de olhá-lo. Observou o rosto de Ukkor fitando a escuridão que, aos poucos, começava a se esvair. Ficou admirando os traços dele, percebendo suas nuances como nunca percebera antes.

— É esquisito. Parece que sinto meu coração — constatou para si sussurrando mais uma vez, porém, alto o suficiente para o mais alto ouvir.

Continuava o analisando, seguindo até o pescoço e dando um breve sorriso pela marca feita pela berlinda estar sumindo. Voltou a levar a mão ali, sentindo uma sensação engraçada no estômago, dedilhando o local. O corpo de Ukkor estremeceu sob o toque inesperado, mas que desejava. Yoru passou os dedos pela linha que prendia a capa, sentindo o tecido. Era novo tocar as coisas como humano, as texturas agora eram diferentes. Sentia mais e tudo tinha um significado maior.

Findou o toque e voltou a se aconchegar no peito do outro, abraçando as pernas e inconscientemente repousando a cauda no colo de Ukkor, mexendo-a levemente em alguns momentos. O mais velho esperou até que o vulpino se acomodasse, encolhido sobre o próprio corpo, ainda repousado sobre o seu. Sentiu os pelos da cauda deitarem sobre seu colo e, instintivamente, passou a acariciá-la.

— Primeiro nascer do sol que vejo como humano. É lindo — Yoru disse brando.

Ukkor sorriu para aquele comentário, já que quase não existia muito sol em Barovia, mas continuava curioso mesmo com a metáfora sobre o coração. Era uma metáfora, não era?

— Parece que sente seu coração? Todos temos um, não? Você deve até conseguir ouvir o meu — brincou.

O vulpino riu baixo, todos deveriam ter. Deveriam.

— Eu tinha até fazer o contrato com as megeras. Agora além do meu dente, elas tem meu coração lá batendo e uma boneca… Não sei o porquê dela, mas o coração tem a ver com inocência ou algo assim, o dente era pela minha… selvageria? — explicou sereno, curtindo o carinho em sua cauda e suspirando enquanto encostava sua orelha no peito de Ukkor, ouvindo seu coração e voltando a fechar os olhos. — E sim, consigo ouvi-lo. Acho que o meu estaria igual. Quando estou contigo, parece que posso senti-lo novamente.

Respirou fundo, percebendo que, fora o suspiro anterior, não tinha parado para respirar em meio a fala. Era muita informação para si, mesmo já sabendo de tudo, imagina para meio-orc.

— Eu não sei muito bem o que elas quiseram dizer como inocência, já que agora eu sei que existem vários tipos. Até mesmo uma metáfora para a primeira vez sexual, o que elas não tiraram, já que eu acho que não tenho mais — olhou Ukkor com uma clara expressão de dúvida. — Quer dizer, não sei. Fazer uma vez com outro ser-raposa, ambos como uma raposa, conta? Sei que os humanos veem essas questões sexuais de forma diferente.

Voltou a fitar o horizonte com o rosto ainda franzido e as orelhas em movimentos erráticos, denotando sua confusão. Confusão, essa, que praticamente vertia da mente do mais velho. Sentimentos por si só são confusos e, no caso de Yoru, fugiam do controle. Não conhecia o passado do vulpino, e nem ele parecia lembrar.

Talvez a boneca fosse a resposta, mas era difícil de traçar uma linha de raciocínio, já que o vulpino parecia se lembrar muito bem de certos acontecimentos de seu passado. Detalhes que Ukkor preferia não questionar sobre. As orelhas de raposa, inquietas, faziam cócegas contra seu peito.

— Dente… selvageria por humanidade. Coração… inocência por perspicácia. Boneca… infância? — questionava para si e para o mais novo. — Pessoas costumam dizer que bonecos são coisa de criança. O que é uma tolice, na minha opinião.

Suspirou e, inconscientemente, apertou o abraço em Yoru. Não tenso, mas com ternura. Preocupação. Quando o menor sentiu o aperto, só se aconchegou mais, abaixando as orelhas; completamente tranquilo. Sentia-se completamente protegido, como se nada pudesse os atingir. Era um sentimento muito bom.

— Eu não sei que diabos de maldade as megeras podem fazer com seu coração, mas espero que elas não tentem nada que te prejudique. Vanya disse que a fúria deve ser uma escolha — desviou os olhos da escuridão e olhou para o menor, aninhando contra seu corpo. — E eu escolheria despejá-la sobre aquele moinho até não restar nada além de pó.

— Tudo é uma escolha, e essa eu ajudo a concretizar te protegendo, se for necessário. Porque seria satisfatório ver isso — comentou trazendo a mão de Ukkor para perto da sua, passando-a pela linha de sua cintura para poder tocá-la melhor, desenhando com delicadeza as linhas de sua palma com a ponta da sua unha afiada.

Yoru explorava toda parte de pele conseguia, passando um pouco pelo antebraço até onde podia, deslizando a unha com cuidado e sentindo a pele com a ponta dos dedos. Era como senti-lo pela primeira vez, tentando entender as sensações humanas que os toques lhe causavam.

Por outro lado, Ukkor sentia os dedos do mais novo deslizando pelo corpo, e ele formigava sob a pele, uma sensação querendo explodir para fora. Não negou qualquer toque, sequer se movia voluntariamente. O vulpino parecia curioso com muita coisa desde que retornara do moinho, como se estivesse redescobrindo o mundo sob novos olhos.

— Eu não tenho certeza sobre o que cada coisa significa — a voz do mais novo despertou Ukkor de seus pensamentos. — , mas no contrato dizia que tudo estaria intacto pra ter de volta caso eu entregue algo tão valioso quanto a vida de duas crianças. Mas não quero pensar nisso agora, ainda estou tentando me entender nessa mente de agora. A única coisa que me dá angústia é não conseguir lembrar de algumas coisas… isso me agonia, muito. Por mais que eu tente, não consigo e só fico com dor de cabeça.

Suspirou e desviou o olhar de sua mão, mantendo-o baixo e um tanto triste. Era difícil. Queria muito recordar e entender, tinham coisas que apareciam em sua mente que eram muito dolorosas, mas não conseguia lembrar o porquê de terem acontecido. Não sabia sequer o motivo de ter fugido do moinho. Havia algo além dos maus tratos, mas nada vinha em suas lembranças, era tudo um breu.

— Vamos descobrir juntos — Ukkor sentenciou, virando a mão devagar, segurando a do mais novo, pequena contra a sua.

Virou o rosto e olhou o vulpino, esperando ele erguer o rosto para que pudesse encarar eles, os olhos amarelos, antes de continuar:

— Vamos descobrir o que é que te aflige e resolver isso. E vamos descobrir sobre as coisas que você sente, e como se sente. Devagar e com… calma — não conseguiu impedir um sorriso.

Aquele sorriso que aquecia o tórax de Yoru e o fazia dar um leve suspiro, retribuindo o curvar de lábios. Até fechou os olhos ao fazê-lo; sinal de um sorriso verdadeiro.

— Sim, vamos juntos! Como é pra ser — disse sem sequer parar para pensar, não entendendo o peso das próprias palavras e a sinceridade delas. — E aprenderemos juntos a ter calma, controlar sua magia e entender todos esses sentimentos que eu tenho agora. Vai ser trabalhoso, mas contanto que estejamos juntos, acho que tudo vai ficar bem. Pelo menos é o que sinto.

Abriu os olhos enquanto falava, perdendo-se nos do meio-orc, mantendo o sorriso que agora era mais singelo e doce. Respirava fundo porque o ar parecia pesado, esquentando todo seu corpo com amor. Uma ligação tão palpável que qualquer ume poderia sentir.

Um barulho na floresta chamou a atenção dos dois. Yoru virou o rosto na direção do som, com as orelhas atentas. Os músculos de Ukkor retesaram de imediato. A mão que antes acariciava o vulpino saltara para o cabo do mangual. Então, em meio às árvores, viram um cervo. O mais velho suspirou, relaxando os ombros enquanto o outro ria e voltava a relaxar. Sentia falta de olhar o meio-orc nos olhos, mas não sabia como fazer acontecer de novo. Suas bochechas estavam coradas novamente.

Ukkor olhou de soslaio para Yoru, que fitava as próprias mãos outra vez, o rosto corado. Rubro parecia ter se tornado a cor padrão de sua face quando estavam sozinhos. O vulpino parecia que não sabia que sentia vergonha. Ou do que sentia.

— Sempre juntos — repetiu o maior após relaxarem, aconchegando o menor sem tentar atrair seu olhar outra vez.

Era difícil para Yoru esquecer os olhos daquele que trazia seu alento. Fechou os próprios, tentando ter uma memória mais palpável. Mais cedo, Ukkor havia falado dos olhos do vulpino, mas mal sabia ele que os próprios eram tão expressivos e bonitos. Ele inteiro era bonito, na verdade. A voz dele repetindo sua frase pintou um pequeno sorriso em seu rosto. Buscou seu olhar novamente, sem sucesso, mas ainda assim manteve o sorriso, vendo agora a escuridão cedendo o máximo que ela faria, dando espaço ao novo dia.

Voltou a repousar a cauda no colo do outro, pegando novamente uma de suas mãos, apenas para mantê-las juntas. Ukkor repousou uma mão carinhosa sobre a cauda do mais novo. Sentia formigar a mão que fora entrelaçada pelo vulpino, e sentia uma vontade latente de virá-la, segurar o mais novo e puxá-lo. Tê-lo para si. Mas focou no que ele começou a dizer enquanto afastava esse pensamento. A voz doce de Yoru, carregada de curiosidade, era agradável e bem-vinda.

— Você sabia que existem seres-cervos? Como eu, ser-raposa. Elus tem focinho de cervo e galhada na forma humana. O rabo é mais fácil de esconder também — dizia com simplicidade, querendo manter uma conversa. Percebeu que gostava muito de falar, agora que sabia.

— Acredito que o rabo seria o menor dos problemas para esconder quando se tem um belo par de galhadas à mostra. E, particularmente, eu acho seu par de orelhas mais fofinhos — disse dando de ombros.

Yoru moveu as orelhas em sua direção quando as mencionou, brincando e fazendo cócegas em sua bochecha.

— Fico feliz que goste, porque não é opcional aqui — acabou soltando uma risada baixa, voltando a olhar o horizonte e mexendo lentamente os dedos juntos aos do outro num carinho desajeitado e inconsciente.

Ukkor podia sentir as mãos um pouco suadas enquanto o mais novo as acariciava. Não era nervosismo, nem calor. Não o calor do ambiente, ao menos.

— Será que aquele era um desses? — era Yoru. — Eu nunca os vi fora do moinho, vai saber se estamos perto de sua área!

— Tinha outros no moinho?

— Tinha sim, sempre os mesmos três: seres-raposa, cervo e corvo. Geralmente não juntos, e não por muitos anos. Pouco antes da idade adulta elas matam, mas sempre pegam quando criança. Nunca entendi o porquê de eu ter ficado vivo, mas acho que elas precisavam de um servo para ajudar com a bagunça.

Completou dando de ombros. Já tinha pensado muito sobre isso, mesmo antes do contrato com as megeras, durante quatro longos anos que fora mantido em cárcere durante a puberdade naquele moinho. Nunca chegou em uma conclusão e não chegaria agora.

— Vai saber o que aquelas velhas bruxas planejam ou pensam — Ukkor dizia. — Gostaria que você nunca tivesse sofrido o que passou, você merece coisas muito melhores da vida.

— Eu também queria que você nunca tivesse passado pelas situações que listou para Vanya, mas aconteceram e fazem parte de nós. É o que é, e vamos aprender a lidar com isso.

Os dois suspiraram com suas conclusões e o maior esticou as costas, erguendo um pouco o mais novo ao fazê-lo e o assustando. Yoru riu alto com a surpresa e logo censurou a própria risada. Ambos respiraram fundo, deixando-se perder no carinhos das mãos.

— Tem certeza que está bem sem algumas horas extras de sono? — era Ukkor.

— Tenho, eu gosto de ficar contigo. E sonhos humanos me assustam. E daqui a pouco vamos precisar levantar mesmo. E eu dormi o suficiente antes do meu turno de vigília.

O pouco sol baroviano começava a tentar rasgar as nuvens, sem muito sucesso. Yoru tinha razão, era hora de ir de qualquer forma. Ukkor dobrou as pernas contra o corpo, tomando cuidado para não sacudir ou derrubar o vulpino enquanto se colocava de pé; deixando a capa grossa onde estava ao se erguer e se espreguiçar com mais intensidade.

Olhou para baixo, para a expressão de Yoru e esticou a mão para que ele a alcançasse e ficasse de pé enquanto dizia:

— Então, vamos à caça, Miku? — lançou-lhe um sorriso tênue, acompanhado do convite impresso em sua memória.

Exatamente como sempre o convidava pelas manhãs a anos atrás.

Era uma sensação nostálgica para o mais novo, que se virou de costas e deu uma leve corridinha, saltando e se transformando em raposa. Trotou um pouco pelo local, logo indo em direção a Ukkor e passando por entre suas pernas rapidamente, como se tentasse derrubá-lo. Fez um som que parecia uma risada e voltou a correr silenciosamente em direção ao bosque.

O meio-orc não conseguia deixar de sorrir com aqueles gracejos e pensava que, talvez, levasse algum tempo para se habituar com o fato de que o outro ainda virava uma raposa. Contudo, agora, ele sabia que Yoru era uma pessoa, não um animal; e isso mudou a forma como ele olhava para o mais novo.

A pequena raposa olhou novamente para o maior que pegava suas coisas do chão e jogava a capa sobre o corpo mais uma vez. Virou para o bosque e correu mata adentro, procurando algum animal para caçarem e sempre atento para ver se o meio-orc seguia em seu encalço.

Era um belo início de manhã, com certeza.

Ukkor e Yoru estavam de muitíssimo bom humor.

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Diogo Stone
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Written by Diogo Stone

Diogo é programadore, escritore, game designer e hater de impressoras. Uma pessoa entusiasmada que escreve contos de fantasia aqui e regras de RPG na Naiá Jogos

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